REDAÇÃO CENTRAL, 26 Ago. 19 / 06:05 am (ACI).-
Em um texto publicado, nesta terça-feira, 20, Dom José Luis Azcona, bispo
emérito de Marajó, na Amazônia brasileira, dedicou uma parte inteira a analisar
a atuação da Rede Eclesial Pan-amazônica, REPAM, a qual classifica como uma
“instituição de pensamento único” o que seria, na opinião do bispo, algo
“ameaçador” para o caminho da sinodalidade e um perigo para a unidade eclesial
do Brasil, a presidência da entidade, representada pelo Cardeal Dom Claudio
Hummes e Dom Erwin Kräutler, nega as críticas do bispo.
Vale recordar
que o Presidente da REPAM é o Cardeal Cláudio Hummes, que atualmente tem 85
anos de idade e seu vice-presidente, o bispo prelado emérito do Xingú, o
austríaco Dom Erwin Kräutler, há anos tem defendido a ordenação de homens
casados e o sacerdócio feminino. Eles são os autores da resposta da REPAM às
críticas do missionário agustino e bispo emérito de Marajó (PA), Dom José Luis
Azcona, enviada a ACI Digital,
na quinta-feira, 22.
Na parte de
um recente artigo em que critica a atuação da REPAM, Dom Azcona afirma
primeiramente que a entidade age no sentido contrário ao que foi pedido no
documento de Aparecida, afirmando que atualmente “não existe” a pastoral de
conjunto para a Amazônia que os bispos da
América Latina reunidos na casa da Mãe Aparecida em 2007 recomendaram e lamenta
que “causas históricas, geográficas, culturais” mas também “eclesiais”, levaram
a uma compreensão teórica da Amazônia sem unidade nem conexões explícitas entre
as Igrejas da mesma”.
“O primeiro
apelo explícito a esta pastoral de conjunto o encontramos em Aparecida (2007)
entre as propostas e orientações elencadas no número 474”. Em seguida, o
emérito de Marajó, recorda outro numeral do Documento de Aparecida
especificamente dirigido a uma pastoral de conjunto na região amazônica:
“Estabelecer entre as Igrejas locais de diversos países sul-americanos, que
estão na bacia amazônica, uma pastoral de conjunto com prioridades
diferenciadas para criar um modelo de desenvolvimento que privilegia os pobres
e sirva ao bem comum” (Documento de Aparecida 475).
“É digno de
notar-se que na década dos anos 90, os Bispos da Amazônia elaboraram um
Manifesto da Amazônia, entregue a diversos organismos internacionais, ao
Vaticano e lançado em celebração memorável em Assis. Este fato indica a
solicitude pastoral dos Bispos da nossa região diante da realidade,
problemáticas e esperanças da ecologia integral”, prossegue o bispo.
Dom Azcona não
nega que a REPAM possa ter tido um papel positivo. O próprio afirma que, a
entidade, “neste fecundo processo de amadurecimento eclesial” colaborou
“criando laços de cooperação, articulação etc. para dar forma ao sonho de uma Igreja em
comunhão na Amazônia”.
“O que tem mudado com a criação da REPAM é valiosíssimo para o conhecimento,
comunicação, interação, colaboração das Igrejas da Amazônia. É algo
verdadeiramente providencial. Os resultados estão à vista: melhor conhecimento
da realidade pan-amazônica, empatia iniciada entre as diversas Amazônias,
consciência de unidade, articulação inicial para efetivar a unidade em ordem à
missão na Amazônia e desde a Amazônia...”, destaca.
Entretanto,
Dom Azcona explicita a discrepância da atuação da Rede Eclesial Pan-Amazônica
com o pedido dos bispos latino-americanos em Aparecida: “Por outra parte a
REPAM não representa a variedade de cosmovisões, identidades diversas,
pensamento teológico e pastoral aberto. É uma instituição de pensamento único e
isto é ameaçador até por ser um perigo para a liberdade de pensamento na Igreja
da Amazônia. É uma Amazônia imposta”.
Por meio de
sua presidência, a REPAM nega esta crítica de Dom Azcona asseverando que as
mesmas: “são inaceitáveis pois não correspondem à verdade. Revelam
desinformação a respeito da REPAM e o empenho dessa Rede nos países que compõem
a Amazônia, incentivado continuamente por nosso Papa Francisco”.
Mais adiante,
Dom Azcona, suscitou outro tema controverso, apontado em outra ocasião pelo
Cardeal Ludwig Müller, Prefeito Emérito da Congregação para Doutrina da Fé, que
foi a participação da REPAM no desenvolvimento do Instrumentum Laboris do
Sínodo, apontando na linha da crítica do Cardeal alemão, ao concluir que o
texto traz um “pensamento teológico e pastoral fraco”.
“Em função do
Sínodo, para começar, o texto elaborado sob a responsabilidade da REPAM
decepcionou, ao não apresentar com clareza uma reflexão ordenada. Por exemplo,
com relação ao método "ver-julgar-agir", um instrumento metodológico
e pastoral de tanta tradição latino- americana, foi apresentado confundindo os
três passos ao incluir ideias e conceitos deslocados e sem e articulação entre
as partes”, diz o prelado.
“Em alguns
aspectos oferecendo propostas pastorais já faz anos superadas e não sólidas. Se
se tratava de provocar “reação”, conseguiu desinteresse no estudo do
mesmo. O mesmo se diga de distribuição, em partes do IL. Tanto no
Encontro dos Bispos da Amazônia Legal do ano passado em agosto, como na
Assembleia geral da CNBB este ano em Aparecida, foram apresentados
questionamentos nucleares sobre pontos neurálgicos do Sínodo a partir do
Documento Preparatório como evidência de um patrulhamento do pensamento único
da REPAM”, prossegue.
“A publicação
do IL confirmou aquilo que foi anunciado como não consistente, alheio à verdade
da Amazônia hoje e as linhas fundamentais de consenso amazônico sobre o qual
possamos caminhar”, afirma Dom Azcona.
Respondendo a
esta crítica , Dom Claudio Hummes e Dom Erwin Kräutler, por sua parte, dizem
que “é absolutamente infundada essa afirmação (de que a REPAM seja a autora do
Instrumentum Laboris) e acrescentam que “Dom Azcona não participou de nenhuma
reunião em Roma, convocada pelo Papa Francisco”.
“A REPAM não
é autora nem dos “Lineamenta” nem do “Instrumentum Laboris”, dizem o Cardeal
Hummes e Dom Erwin Kräutler. Respondendo a ACI Digital, os bispos da
presidência da REPAM explicitam que a entidade esteve encarregada “de ouvir as
vozes da Amazônia, sistematizar o conteúdo e entregá-lo para a Secretaria Geral
para o Sínodo, em Roma, que providenciou a presidiu em nome do Papa Francisco
as reuniões do Conselho Pré-sinodal”.
“À REPAM foi
solicitado formalmente o apoio à Secretaria Geral para o Sínodo e ao Conselho
Pré-Sinodal presidido pelo Papa Francisco, no processo de escuta ativa e direta
em toda a extensão do território Pan-Amazônico, no levantamento adequado das
informações para ajudar na elaboração do Documento Preparatório (Lineamenta) e
do Documento de Trabalho (Instrumentum Laboris). A confecção do Instrumentum
Laboris seguiu os trâmites previstos pela Secretaria Geral para o Sínodo. Uma
equipe de especialistas nomeada pelo Papa elaborou uma proposta levando em
consideração as diversas contribuições recebidas durante o processo de escuta.
Essa proposta foi minuciosamente analisada e trabalhada pelo Conselho
Pré-Sinodal em maio deste ano e recebeu inúmeros acréscimos, precisões e
aperfeiçoamentos e foi finalmente entregue à Secretaria Geral para o Sínodo
para ser divulgado nos idiomas Espanhol e Português”, dizem o presidente e o
vice da entidade.
O
“Instrumentum Laboris” é um “instrumento” e nada mais que um instrumento e
serve como subsídio para animar a maior participação possível dos diversos
atores da Amazônia e depois como uma espécie de guia para o Sínodo propriamente
dito em outubro. Não é um documento perfeito e pronto a ser votado mas um mero
manual de trabalho”, diz a presidência da REPAM.
Ao finalizar
seu texto, o prelado reitera sua crítica ao tema da atuação pastoral da REPAM,
afirmando que o pensamento único e forma de atuar da entidade têm diminuído o
interesse de parte do episcopado brasileiro no Sínodo.
“Na
atuação monocrática, sem ouvidos para o diálogo sereno e entre iguais, se
encontra uma das raízes de certo desinteresse, evidente na Igreja do Brasil,
pelo Sínodo da Amazônia. Junto a isto, aparece como motivo coadjuvante para
esta falta de interesse “por este projeto messiânico” o fato de o IL partir dos
indígenas na Amazônia, evangelizando assim a mesma e daí o mundo inteiro. A
ausência do realismo pastoral: pentecostais, cultura urbana, religiosidade
popular, dimensão sóciotransformadora na direção da REPAM está produzindo áreas
insensíveis ao Sínodo na consciência eclesial do Brasil e também da própria
Amazônia; por exemplo, o desinteresse pela oração na preparação do Sínodo a
partir da experiência do Espírito, para um novo Pentecostes que necessita de “calorosos
momentos de oração comunitária para a grande missão” (Documento de Aparecida
362). Isto preocupa! ”, escreve Dom José Luis.
Ante a
crítica, o Cardeal Hummes e Dom Erwin responderam: “não é de nosso conhecimento
tal reação ou postura de setores do episcopado. Pelo contrário, temos recebido
muito apoio ao processo Sinodal, inclusive de dioceses e Igrejas particulares
fora da Amazônia” e concluem dizendo que “cabe ao autor o ônus de identificar
esses “determinados” grupos de bispos por nós desconhecidos como também
explicitar a razão desta “certa reserva e apreensão”.
Dom José Luis
Azcona conclui seu artigo asseverando que: “o pensamento um tanto estreito da
REPAM está criando a sensação de que, em vez de ser um “caminho sinodal”, de
fato é um "caminho monodal”, monocorde, monocromático, perigoso, portanto,
para a unidade eclesial”.
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