Por que será?
REDAÇÃO
CENTRAL, 30 Ago. 19 / 03:00 pm (ACI).- Em mais um artigo crítico ao Instrumentum Laboris (IL)
do Sínodo para Amazônia, que decorre entre os dias 06 e 27 de outubro no
Vaticano, o bispo emérito da Prelazia de Marajó (PA), Dom José Luis Azcona,
chama atenção para a total ausência do elemento central do anúncio
evangelizador no documento de trabalho dos padres sinodais que é a referência a
Cristo Crucificado, que "não é proclamado nem lembrado uma só vez” no
documento, o que, segundo o bispo leva a suspeitas “fundadas” sobre a condição
cristã deste escrito.
O artigo
de Dom José Azcona leva por título: “A SALVAÇÃO EM CRISTO NO INSTRUMENTUM
LABORIS – IL” e foi enviado em exclusiva a ACI Digital na manhã desta
sexta-feira, 30.
Dom José
inagura sua reflexão afirmando que “A Igreja existe para
anunciar a salvação. Esta é a sua identidade, sua graça, sua vocação.
“A
Salvação é "esse grande dom de Deus que é libertação de tudo aquilo que
oprime o homem e que é libertação sobre tudo do pecado e do maligno, na alegria
de conhecer a Deus e de ser por Ele conhecido", afirma o prelado citando o
numeral 9 da Exortação Apostólica Evangelii Nuntiandi, de São Paulo VI.
“A
evangelização tem como conteúdo essencial e sempre "a salvação em Jesus
Cristo Filho de Deus, feito homem, morto e ressuscitado. Salvação que se
oferece a todos os homens, culturas e povos como dom, graça e misericórdia do
mesmo Deus" (EN 27). "Pela graça fostes salvos por meio da fé. Isto
não vem de vós; é dom de Deus" (Ef 2,8; Rm 1,16)”. (...) “Por isso, a
única Igreja de Jesus é aquela que testemunha isto. Qualquer outra igreja que
não seja fiel a este testemunho é uma congregação de satanás, "pai da
mentira" (Jo 8,44) e que chega também na Amazônia "para roubar, matar
e dispersar" (Jo 10,10)”, escreve Dom Azcona.
Assim, o
prelado recorda que a salvação cristã “não é uma salvação imanente ao mundo,
limitada portanto, às necessidades humanas materiais e mesmo espirituais e que
a mesma “tampouco se exaure no âmbito de uma existência temporal que se
identificasse com as aspirações e esperanças das culturas e dos povos também
amazônicos”.
“A Igreja
de Jesus Cristo é aquela que "vai peregrinando entre as perseguições do
mundo e as consolações de Deus," (Agostinho, Cidade de Deus XVIII, 52,2)
anunciando a cruz do Senhor até que Ele venha" (LG 8c). Esta é a mesma
Igreja que "assim como Cristo realizou a obra da redenção na pobreza e na
perseguição, está destinada a percorrer o mesmo caminho a fim de comunicar os
frutos da salvação aos homens" (LG 8d), "para evangelizar aos pobres
e libertar os oprimidos" (Lc 4,18), também da Amazônia e no
"hoje" da missão amazônica (Ibid)”, esclarece Dom José.
Em
seguida o prelado lança mais uma crítica ao Instrumentum Laboris, o documento
que servirá de base para as reflexões do Sínodo da Amazônia em outubro: “A
ausência alarmante do tema da cruz no IL levanta suspeitas fundadas sobre a
condição cristã do mesmo. Cristo crucificado não é proclamado nem lembrado uma
só vez”.
“Um único
texto claro sobre a " Igreja que anuncia o mistério de sua morte e
ressurreição" (IL 115) com outro semelhante no número 123a, evidencia uma
presença precária do mistério pascal e sem consequências no texto. Esta
presença acanhada e periférica de Cristo crucificado que evoca a rejeição de
Paulo "à sabedoria da linguagem (ICor 1,17;Gl 2,19-21) é dizer, a oposição
radical a uma apresentação do evangelho como especulação do pensamento ou como
discurso sobre culturas, etnias, povos, biomas, ecologia integral, diálogo sem
o eixo da Cruz, torna esta estéril e anula por completo o seu poder”.
“Assim o
IL "esteriliza", "anula" a cruz de Cristo "se
envergonha dela" num momento histórico como este, crucial para a Igreja,
para a humanidade e para a Amazônia”, assevera Dom Azcona.
Ainda
segundo o emérito de Marajó, “o mais grave não é o silêncio envergonhado sobre
o Cristo crucificado. É a eliminação sumária Dele ("Não queremos que Este
reine sobre nós") no momento em que é necessário confessá-lo abertamente e
com alegria, experimentando a coragem do Espírito para proclamar a glória
Daquele que é a nossa única esperança”.
“Hoje o
Crucificado é negado e renegado pelos cristãos, principalmente porque com seu
voluntarismo, "entusiasmo", pragmatismo, pelagianismo de toda
espécie, torna ilusória, teórica e imaginaria a soberania da cruz que distingue
e faz inconfundível Jesus de Nazaré com outros fundadores de religiões,
culturas, moralismos, filósofos e teólogos (não crucificados)”, asseverou.
“Nós
queremos proclamar com toda a Igreja Latino Americana e do Caribe que:
"Uma autêntica evangelização dos nossos povos envolve assumir plenamente a
radicalidade do amor cristão que se concretiza no seguimento de Cristo na Cruz;
no padecer por Cristo por causa da justiça; no perdão e no amor aos
inimigos. Esse amor supera o amor humano e participa do amor divino, único eixo
cultural capaz de construir uma cultura da vida"(Dap 543)”,
finalizou.
Confira
na íntegra o artigo de Dom José:
A
SALVAÇÃO EM CRISTO NO INSTRUMENTUM LABORIS - IL
"Quanto
a mim, não pretendo, jamais, gloriar-me, a não ser na cruz de nosso Senhor
Jesus Cristo, pela qual o mundo está crucificado para mim e eu para o
mundo." (Gl 6,14 )
A Igreja
existe para anunciar a salvação. Esta é a sua identidade, sua graça, sua
vocação.
Salvação,
"esse grande dom de Deus que é libertação de tudo aquilo que oprime o
homem e que é libertação sobretudo do pecado e do maligno, na alegria de
conhecer a Deus e de ser por Ele conhecido" (EN 9).
A
evangelização tem como conteúdo essencial e sempre "a salvação em Jesus
Cristo Filho de Deus, feito homem, morto e ressuscitado. Salvação que se
oferece a todos os homens,culturas e povos como dom, graça e misericórdia do
mesmo Deus" (EN 27). "Pela graça fostes salvos por meio da fé. Isto
não vem de vós; é dom de Deus" (Ef 2,8;Rm1,16,passim).
Esta
salvação é o próprio Jesus Cristo que salva o seu povo dos seus pecados (Mt
1,21) e que profetizada e testemunhada com a própria vida por João Batista,
este é enviado a "preparar os seus caminhos anunciando ao seu povo a
salvação que está na remissão dos pecados" (Lc 1,77). Esta é a salvação
única anunciada em todosos salmos, na lei e nos profetas de que em Cristo
sofredor que ressuscita dos mortos e que em seu Nome (obediência até a morte),
seja proclamado o arrependimento para o perdão dos pecados a todas as nações,
etnias e culturas, também as amazônicas.
Por isso,
a única Igreja de Jesus é aquela que testemunha isto. Qualquer outra igreja que
não seja fiel a este testemunho é uma congregação de satanás, "pai da
mentira" (Jo 8,44) e que chega também na Amazônia "para roubar, matar
e dispersar" (Jo 10,10).
Os
pastores destes grupos não foram revestidos com o Espírito da verdade, nem batizados
com Ele, nem viram realizar-se ainda a Promessa do Pai no novo Pentecostes conciliar,
nem experimentaram a força do Alto " (Cfr. Lc 24,44-49; At 2,38;11
15-18;26,19-23; RM 24; Ap 548-549;362).
Esta
salvação não é uma salvação imanente ao mundo, limitada portanto, às
necessidades humanas materiais e mesmo espirituais (EN 17).
Tão pouco
se exaure no âmbito de uma existência temporal que se identificasse com as
aspirações e esperanças das culturas e dos povos também amazônicos.
E a
"adesão a fé" (Gl 3,2), a única que traz a salvação, é exclusivamente
esta: " Nós cremos Naquele que ressuscitou dos mortos, Jesus Nosso Senhor
o qual foi entregue a morte por nossos pecados e ressuscitado para a nossa
salvação" (Justificação) (Rm 4,24-25).
Não há
outro evangelho que este. "Não existe outro Nomeno no qual possamos ser
salvos ( At 4,12). Evangelho que assumindo, sanando, purificando, renovando,
elevando, glorificando com seu poder e sabedoria, é dizer a cruz (ICor 1,17-25)
salva toda a humanidade, todos os povos, todas as culturas, toda a história.
Não existe outro evangelho!. E isto se silencia no IL.
Se trata
da fé. Da fé que é necessária para a salvação. A fé do Símbolo dos apóstolos esquecido
pelo IL. De fato, se trata da negação da fé da Igreja, se invalida o Sínodo, se
inutilizam todos os esforços para construí-lo e se estrangula de uma vez, a
esperança da Amazônia e do mundo.
Em
concreto, a esperança proclamada no IL não é a esperança cristã (Hb 11,1); de
fato é a negação expressa da "grande esperança" (Spe Salvi). Uma
esperaça que "confunde e decepciona" (Cfr Rm 5,5), que fecha de uma
vez e para sempre o futuro da Amazônia e do mundo.
Acaba com
os "novos caminhos" para a Igreja na Amazônia porque nega o amor de
Deus que faz inabalável a esperança (Ibid), sequestrando a cruz de Cristo,
única identidade do amor na história e no mundo (Rm 5,6-11).
Sabemos
pela fé que esta esperança que não decepciona, é Cristo e Cristo crucificado.
"Ave Crux, Spes única! "(Salve Cruz,única esperança).
"Esta
salvação ressoou no Sínodo dos Bispos (2002) e deve
continuar a ressoar em nossos lábios porque a cruz é mistério de morte e de
vida. Anunciamos que na árvore da cruz a vida venceu o inferno"(Cfr Pastores Gregis 5).
A falta
de alegria missionária e esta ausência da "grande esperança"
evidenciam a negação da cruz de Cristo.
Assim, a
missão da Igreja hoje e especialmente na Amazônia fica absolutamente esvaziada
e anulada:"A Igreja dos profetas das testemunhas e dos servidores da
esperança"(Ibid) estamos tragicamente diante de uma recaída fatal,
portanto, no paganismo,"para quem não há esperança"(Ef 2,12-14).
Analisemos
nestes tempos conturbados as regras de discernimento cristão que dirige a
Igreja.
1.AsInstituições
da Igreja: Dioceses, paróquias, CEBs, Novas Comunidades, Grupos, Estruturas
estão vivas e portanto são missionárias enquanto nos convidam, chamam, animam e
ajudam a seguir o Senhor Jesus até o calvário."Se alguém quer vir após
mim, renuncie a si mesmo, tome a sua cruz a cada dia e síga-me"(Lc 9,23).
2.A
verdadeira unidade eclesial assim como as divisões entre nós,também diante do
Sínodo, dependem disso: até onde servimos nós ao Senhor Jesus, seguindo-o com a
cruz nos ombros e até onde Ele, enquanto crucificado é negado, renegado por nós
em nome da religião, das estruturas eclesiais, da organização, do meu
organograma pastoral, do "meu" Sínodo?
3.Proclamar
no Sínodo a fé em Jesus de Nazaré como Filho de Deus e Messias (Mt 16) não
salva a ninguém. Até podemos merecer o nome de satanás (Como Pedro) se pensamos
Nele como os homens e não como Deus.
4.Assim,
a comunhão na Igreja será uma encenação vã que representará uma comunidade de
homens e mulheres devotos, piedosos, unidos por rituaisde rara solenidade, sem
vigor missionário,bem longe do povo de Deus vivo, resgatado e reunido pelo
sangue do Cordeiro e no Corpo de Cristo. A Comunidade de Cristo está dividida e
deixa de ser missionária quando esquece a sua identidade mais profunda: Estar
crucificada com Cristo (Rm 6,6; Gl 2, 19; ICor 1-13)
5.Hoje o
Crucificado é negado e renegado pelos cristãos, principalmente porque com seu
voluntarismo, "entusiasmo", pragmatismo, pelagianismo de toda
espécie, torna ilusória, teórica, imaginaria a soberania da cruz que distingue
e faz inconfundível Jesus de Nazaré com outros fundadores de religiões, culturas,
moralismos, filósofos e teólogos (não crucificados).
Nós
queremos proclamar com toda a Igreja Latino Americana e do Caribe que:
"Uma autêntica evangelização dos nossos povos envolve assumir plenamente a
radicalidade do amor cristão que se concretiza no seguimento de Cristo na Cruz;
no padecer por Cristo por causa dajustiça; no perdão e no amor aos inimigos.
Esse amor supera o amor humano e participa do amor divino, único eixo cultural
capaz de construir uma cultura da vida"(Ap 543). Portanto, evangelizar a
Amazônia, através da "conversão ecológica", na experiência e na
vivência apaixonada das exigências da "ecologia integral" é abrir um
futuro de esperança firme para ela e para o mundo.
Hoje, dia
do martírio de São João Batista "o maior dos profetas", São Beda Venerável
comentando seu martírio nos diz:" O perseguidor não lhe disse que negasse
a Cristo, mas que calasse a verdade.Cristo disse: " Eu sou a
verdade"(Jo 14,6). Por conseguinte, morreu por Cristo, já que derramou o
seu sangue pela verdade"(Homilia 23)
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